Estamos
aqui novamente para concluir o assunto que temos explorado nos dois últimos
artigos: a essência da Doutrina Social da Igreja. Pedimos ao leitor desculpas
por nos termos alongado tanto, mas um tema tão grave e importante não merece
ser tratado com ligeireza. O papa Paulo VI, na encíclica Populorum Progressio, fez um apelo aos cristãos para que se
esforçassem por ser “homens capazes de reflexão profunda” (n. 20) e, se por um
lado nos anima o impulso catequético de falarmos da maneira mais compreensível
que podemos, pelo mesmo motivo nos esforçamos por esmiuçar a matéria tintim por
tintim, de modo a tornar claros todos os pontos fundamentais.
A partir de
uma reflexão sobre o magistério do papa Bem-aventurado João Paulo II, no
primeiro artigo nosso a tratar deste tema mostramos que a Doutrina Social da
Igreja não é uma ideologia e, por isso, não pertence ao mesmo gênero do
liberalismo e do socialismo. Uma ideologia é um sistema de ideias fundado em
premissas arbitrárias e parciais, que passa uma falsa impressão de verdade em
razão da coerência de suas conclusões. No artigo seguinte, apontamos que, por
não ser uma ideologia, a Doutrina Social da Igreja não traz um pacote de
soluções prontas e acabadas, porém nos oferece princípios de grande valia para,
segundo as diversas circunstâncias de tempo e lugar, encontrarmos as melhores
soluções para os problemas da sociedade.
Agora nos
cabe enfatizar outro ponto do trecho que citamos do papa João Paulo II, quando
ele diz que a Doutrina Social da Igreja pertence «não ao domínio da ideologia,
mas ao da teologia e especialmente da
teologia moral». Ou seja, o papa diz aqui com todas as letras que a Doutrina
Social da Igreja faz parte do ensinamento
moral da Igreja e, por isso, não procede a objeção de certos católicos
desobedientes ou ignorantes que dizem não fazer caso da Doutrina Social da
Igreja porque só seguem o magistério nas matérias de fé e moral. Os princípios
da Doutrina Social da Igreja são orientações morais do Sagrado Magistério e,
como tais, vinculam a consciência dos fiéis.
Boa parte
dos preceitos do que se chama de moral cristã, com exceção do que se refere às
virtudes teologais e à doutrina dos sacramentos, pode ser conhecido pelo homem
sem a necessidade de uma Revelação divina. Não é preciso que esteja escrito na
Bíblia para se saber que não se pode mentir ou roubar. E mesmo que não
estivesse escrito na Bíblia, nem por isso mentir ou roubar deixariam de ser
pecados. Esses preceitos baseiam-se na natureza humana e constituem aquela lei
natural que Santo Tomás de Aquino definiu como sendo o reflexo da lei eterna na
razão natural do homem (cf. Suma
Teológica, Ia IIae, q. 91, a. 2). Todavia, em razão
do pecado original, as potências espirituais do homem estão enfermas e nem
sempre ele consegue, só com as luzes de sua razão natural, captar os preceitos
da lei natural com toda a clareza. Mas a inteligência do cristão não trabalha
apenas com a sua luz natural, mas também com a luz sobrenatural da fé que ajuda
a ver esses preceitos em toda a sua força e esplendor.
Assim, a
Doutrina Social da Igreja explicita os preceitos dessa lei natural que dizem
respeito à sociedade humana, nos domínios da política, da economia e da
cultura. É a defesa da ordem natural
da sociedade, tal como Deus a quis e a criou. E é muito fácil de ver que, se as
coisas estão em desordem, os objetivos não são alcançados. Fora dessa ordem
natural, a sociedade humana não poderá atingir o fim para o qual tende e
assistiremos apenas a uma sucessão histórica de frustrações e fracassos.
Concluindo essas reflexões, já temos segurança para definir a Doutrina Social
da Igreja como sendo o conjunto de ensinamentos de ordem moral do Sagrado
Magistério, à luz das verdades da razão natural e da Revelação divina, que
visam o pleno respeito à ordem natural na constituição e no funcionamento das
sociedades.
por Rodrigo R. Pedroso
________________________
Rodrigo
R. Pedroso, com 32 anos de nascido, é brasileiro, casado,
advogado graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (FD/USP),
mestrando em filosofia política pela FFLCH/USP e procurador da Universidade de
São Paulo. Críticas, dúvidas e sugestões podem ser enviadas para o correio
eletrônico rpedroso01@terra.com.br.
Nenhum comentário:
Postar um comentário