Quarta feira Santa , manhã : Quarta Dor de Maria Santíssima — Encontro com Jesus, que carrega a cruz
Vidimus eum, et non
erat aspectus, et desideravimus eum — “Vimo-Lo, e não havia nele formosura, e por isso nós O estranhamos”
(Is. 53, 2)
Sumário. Consideremos o encontro que no caminho do Calvário teve o Filho com sua Mãe. Jesus e Maria olham-se mutuamente, e estes olhares são como outras tantas setas que lhes traspassam o Coração amante. Se víssemos uma leoa que vai após seu filho conduzido à morte, aquela fera havia de inspirar-nos compaixão. E não nos moverá à ternura ver Maria que vai após o seu Cordeiro imaculado, enquanto o conduzem à morte por nós? Tenhamos compaixão, e procuremos também acompanhar a seu Filho e a ela, levando com paciência a cruz que nos dá o Senhor
I. Medita
São Boaventura que a Bem-aventurado Virgem passou a noite que precedia a Paixão
de seu Filho sem tomar descanso e em dolorosa vigília. Chegada a manhã, os
discípulos de Jesus Cristo vieram a esta aflita Mãe: um a referir-lhe os maus
tratamentos feitos a seu Filho na casa de Caifás, outro os desprezos que
recebeu de Herodes, mais outro a flagelação ou a coroação de espinhos. Numa
palavra, cada um dava a Maria uma nova informação, cada qual mais dolorosa,
verificando-se nela o que Jeremias tinha predito: Non est qui consoletur eam
ex omnibus caris eius (1) — “Não há quem a console entre todos os seus
queridos”
Veio
finalmente São João e lhe disse: “Ah, Mãe dolorosa! Teu Filho já foi condenado
à morte, e já saiu, levando Ele mesmo a sua cruz para ir ao Calvário. Vem, se O
queres ver e dar-Lhe o último adeus, em alguma rua, por onde tenha de passar”
Ao ouvir
isto, Maria parte com João; e pelo sangue de que estava a terra borrifada
conhece que o Filho já por ali tinha passado. A Mãe aflita toma por uma estrada
mais breve e coloca-se na entrada de uma rua para se encontrar com o aflito
Filho, nada se-lhe dando das palavras insultuosas dos judeus, que a conheciam
como mãe do condenado. — Ó Deus, que causa de dor foi para ela a vista dos
cravos, dos martelos, das cordas e dos outros instrumentos funestos da morte de
seu Filho! Como que uma espada foi ao seu coração o ouvir a trombeta, que
andava publicando a sentença pronunciada contra o seu Jesus
Mais eis
que já, depois de terem passado os instrumentos e os ministros da justiça,
levanta os olhos e vê, ó Deus! Um homem todo cheio de sangue e de chagas, dos
pés até a cabeça, com um feixe de espinhos na cabeça e dois pesados madeiros
sobre os ombros. Olha para Ele, e quase não O conhece, dizendo então com
Isaías: Vidimus eum, et non erat aspectus (2) — “Nós O vimus e não
havia n'Ele formosura”. Mas finalmente o amor lho faz reconhecer e o Filho,
tirando um grumo de sangue dos olhos, como foi revelado a Santa Brígida,
encarou a Mãe e a Mãe encarou o Filho. Ó olhares dolorosos, com que, como
tantas flechas, foram então traspassadas aquelas almas amantes!
II. Queria a divina Mãe abraçar a Jesus, como diz Santo Anselmo; mas os insolentes servos a repelem com injúrias, e empurram para diante o Senhor aflitíssimo. Maria, porém, segue — muito embora preveja que a vista de seu Jesus moribundo lhe causaria uma dor tão acerba, que a tornaria rainha dos mártires. O Filho vai adiante, e a Mãe tomando também a sua cruz, no dizer de São Guilherme, vai após Ele, para ser crucificada com Ele
II. Queria a divina Mãe abraçar a Jesus, como diz Santo Anselmo; mas os insolentes servos a repelem com injúrias, e empurram para diante o Senhor aflitíssimo. Maria, porém, segue — muito embora preveja que a vista de seu Jesus moribundo lhe causaria uma dor tão acerba, que a tornaria rainha dos mártires. O Filho vai adiante, e a Mãe tomando também a sua cruz, no dizer de São Guilherme, vai após Ele, para ser crucificada com Ele
Se
víssemos uma leoa que vai após o filho conduzido à morte, aquela fera nos
causaria compaixão. E não nos inspirará compaixão o ver Maria, que vai após o
seu Cordeiro imaculado, enquanto o levam a morrer por nós? Tenhamos compaixão
por ela, e procuremos também acompanhar o Filho e a Mãe, levando com paciência
a cruz que nos envia o Senhor. — Pergunta São João Crisóstomo, porque nas
outras penas Jesus Cristo quis ser só, mas a levar a Cruz quis ser ajudado pelo
Cirineu? E responde: Ut intelligas, Christi crucem non sufficere sinne tua:
Não basta para nos salvar só a cruz de Jesus Cristo, se nós não levamos com
resignação até a morte também a nossa
Minha dolorosa Mãe, pelo merecimento da dor que sentistes ao ver o vosso amado Filho levado à morte, impetrai-me a graça de levar também com paciência as cruzes que Deus me envia. Feliz de mim, se souber acompanhar-vos com a minha cruz até a morte! Vós e Jesus, sendo inocentes, levastes uma cruz muito pesada, e eu pecador, que tenho merecido o inferno, recusarei a minha? Ah, Virgem imaculada, de vós espero socorro, para sofrer com paciência as cruzes (*I 242)
Minha dolorosa Mãe, pelo merecimento da dor que sentistes ao ver o vosso amado Filho levado à morte, impetrai-me a graça de levar também com paciência as cruzes que Deus me envia. Feliz de mim, se souber acompanhar-vos com a minha cruz até a morte! Vós e Jesus, sendo inocentes, levastes uma cruz muito pesada, e eu pecador, que tenho merecido o inferno, recusarei a minha? Ah, Virgem imaculada, de vós espero socorro, para sofrer com paciência as cruzes (*I 242)
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1. Thren. 1, 2.
2. Is. 53, 2.
(LIGÓRIO, Santo Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas
do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa
inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 405-408)
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