sexta-feira, 2 de agosto de 2013

A CORAGEM DE VIVER ALEGRES




Há duas maneiras de viver: buscando o prazer ou buscando a felicidade. Não que o prazer seja um mal, como se fosse a própria antítese da felicidade. Não quer dizer que onde o prazer entra pela porta a felicidade sai pela janela, como se eles não pudessem conviver sob o mesmo teto. Prazer e felicidade não são autoexcludentes. O prazer é bom, ele possui um sentido, tem uma razão de ser, uma finalidade. Só não deve ser supervalorizado. Ele é acessório, e quem se prende demais ao acessório acaba perdendo o principal. Reformulemos, então, nossa primeira afirmação: há duas maneiras de viver – buscando o prazer, que traz a infelicidade, ou buscando a felicidade, que traz o prazer.

Quem quer que seja honesto consigo mesmo poderá perceber que na nossa alimentação, por exemplo, o prazer facilita, torna agradável e mais estimulante, a busca dos nutrientes necessários ao nosso corpo. Cada um poderá chegar com tranquilidade à conclusão de que o objetivo da alimentação não é fartar de prazer o paladar. A alimentação saudável ordena, poda, mantém dentro dos seus justos limites, o prazer que a comida e a bebida proporcionam.

Essa diretriz pode ajudar-nos nos nossos relacionamentos afetivos. O namoro e o casamento não se destinam a fartar de prazer os nossos órgãos sexuais, mas a alimentar de amor o nosso espírito. Ou o amor não é uma necessidade? Não será ele a nossa maior necessidade imaterial? Haverá felicidade possível sem amor? Talvez haja felicidade sem comida ou sem bebida, alimentos do corpo, mas desconfio seja impossível felicidade sem o alimento do espírito. Se repararmos bem, a busca pelo prazer contém algo de monótono, enfadonho, entediante, enjoativo.

É preciso, pois, ser honesto consigo mesmo e com os outros. Será que em todas as carícias que faço em minha namorada eu a estou buscando? Não estarei buscando a mim mesmo? Será que em certos toques, em certos beijos e abraços, eu estou buscando não a minha namorada, mas o prazer que ela me proporciona? Em outras palavras, ao invés de sair de mim mesmo, de transcender-me para levar um bem a ela, para acrescentar-lhe algo, para acariciá-la de uma forma suave e modesta, eu não estou simplesmente me servindo dela, subtraindo-lhe algo, para estimular meu órgão sexual? Não estarei eu instrumentalizando-a, diminuindo-a, utilizando-a como um simples meio de atingir uma mera sensação física, meu real objetivo?

Já tive várias vezes essa sensação de limite, a percepção desse critério. “Até aqui, eu a estou buscando. Daqui em diante, é a mim mesmo que estou buscando, egoisticamente”. E, instantaneamente, após a enfadonha e egoística busca de mim mesmo, o que eu encontro? A tristeza.

Por um estranho desígnio, quanto mais egoístas somos, quanto mais prazer buscamos, mais amargor sentimos. Dizem que o amor dói. Que só há amor quando dói. Creio ser verdade, pois ele contém a capacidade de sacrificar-se pelo outro. O amor é um sair de si mesmo para acrescentar algo ao outro. O egoísmo só vai ao outro para roubar algo para si mesmo. O prazer, a mera sensação não podem ser buscados como fins. Eles frustram. Decepcionam. São carentes. Ficam na superfície, sobre a pele. Não penetram no interior do homem.

O amor é um generoso doador, distribuidor de dons e de bens. O egoísmo é um ladrão. Rouba o que não é dele. Olha o que não pode. Toca o que não convém. Usurpa o que não lhe pertence.

Viktor Frankl, o fundador da logoterapia, fala muito da necessidade da autotranscendência. Diz ele que o sentido de nossas vidas está fora de nós e é maior do que nós. O amor é essa autotranscendência saudável que dá sentido a todas as coisas, que sai de si e se doa. O egoísmo, fonte de tantas neuroses, é solitário; é uma introspecção tristonha e acabrunhante, que refere todas as coisas a si e não sai do seu quarto.

Convém, pois, que tenhamos a coragem de ser felizes, pondo cada coisa no seu lugar e chamando cada uma pelo seu próprio nome.
 
Paul Medeiros Krause

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