SOBRE A ATUAL PROIBIÇÃO
DE RECEBIMENTO DA SANTA HOSTIA SOBRE A LÍNGUA
1.Tem-se imposto, por estes dias, em
várias dioceses brasileiras a vedação do recebimento da Sagrada Forma sobre a
língua, sendo certo que aos Bispos diocesanos compete “dar normas obrigatórias
para todos em matéria litúrgica” (§ 4º
do cânon 838 do Código de Direito Canônico) . Tendo em conta o caráter
público das ações litúrgicas (§ 1º do
cânon 837 desse Código) −ações essas que constituem exercício atualizado da
função sacerdotal de Nosso Senhor Jesus Cristo (§ 1º do cânon 834)−, compete à Sé Apostólica “ordenar a sagrada
liturgia da Igreja universal” e “vigiar para que as normas litúrgicas se
cumpram fielmente em toda parte” (§ 2º
do cânon 838)
Dessa maneira, a potestade dos Bispos
diocesanos quanto ao Direito litúrgico é apenas integrativa e complementar,
exercitando-se intra limites suae competentiae −dentro nos
limites de sua competência (§ 4º do
cânon 838), sob a autoridade do Sumo Pontífice (§ 2º do cânon 381) e da
disciplina comum a toda a Igreja (§ 1º
do cânon 392)
Impõe-se mesmo aos Bispos diocesanos
a relevante missão de
“vigiar para que não se introduzam
abusos na disciplina eclesiástica, especialmente acerca do ministério da
palavra, da celebração dos sacramentos e sacramentos, do culto a Deus e dos
Santos e da administração dos bens” (§
2º do cânon 392)
Vale dizer que a Autoridade
episcopal é titular de uma potestade normativa subordinada às leis universais
expedidas pela Sé Apostólica . Havendo leis gerais para a administração
e recepção lícita dos sacramentos (cânon 841), não compete aos Bispos
diocesanos, com inovação disciplinária, divorciar-se da regulativa universal
2.Deu-se o caso de que a Sé
Apostólica se devotou muito incisivamente ao Direito litúrgico do rito romano
e, entre outras regras −no exercício de sua competência originária e
primacial−, a Sé Romana editou a Instrução Redepmtionis Sacramentum, da Congregação para o Culto Divino
e a Disciplina dos Sacramentos, lei geral acerca da
administração e recepção da Sagrada Forma, em que se lê:
“Todo fiel tem sempre direito a
escolher se deseja receber a sagrada Comunhão na boca ou se, o que vai
comungar, quer receber na mão o Sacramento” (nº 92; vid. ainda Missale Romanum, Institutio
Generalis, nº 161)
Acrescente-se que, em um caso
concreto, a mesma referida Congregação, em resposta a um católico da
Grã-Bretanha, cuja diocese restringira a comunhão na língua por preocupações
relacionadas à epidemia do vírus Influenza A –subtipo H1N1, assim decidiu :
“Este Dicastério observa que sua Instrução Redemptionis Sacramentum (25
de março de 2004) claramente determina que “todo fiel tem sempre direito a
escolher se deseja receber a sagrada Comunhão na língua” (n; 92), nem é lícito
negar a Sagrada Comunhão a qualquer dos fiéis de Cristo que não estão impedidos
pelo direito de receber a Sagrada Eucaristia (cf. n. 91)
A Congregação lhe agradece por trazer
esta importante matéria à sua atenção. Esteja assegurado que os apropriados
contatos serão feitos”
Manifesto, pois, é que, por melhores
sejam as intenções episcopais, não podem os Bispos diocesanos apartar-se da
normativa geral da Igreja por meio de leis locais que discriminem o
direito de escolha dos fiéis quanto a um dos aludidos modos de recepção da
Santa Forma
3.Que fazer?
Esse é o problema dos que almejam
exercitar seu direito de recepção da Sagrada Forma sobre a língua e, muita vez
bem mais que isso, dos que entendem o conteúdo profundo que se sumaria com o
aforismo lex orandi, lex credendi
Tem-se a tentação, na experiência
cotidiana de todos nós, de simplificar as coisas: “diz-me como comungas e te
direis quem és”
Há, contudo, hoje um excesso de
participação laica na Igreja, propiciatória de uma ruptura da ordem
hierárquica, e um explicável inconformismo com doutrinas e, sobretudo, práticas
heretizantes que, hélas!, alguma vez vêm professadas pela mesma Hierarquia.
Mas qual de nós acusará probamente que o só fato da negativa da administração
da Sagrada Forma sobre a língua implica justificada recusa rotunda da
autoridade episcopal?
Não corramos o risco, quando menos
por agora prematuro, de incorrer em sedição. Qual o caminho razoável que se
exige do leigo?
O decoro, a cortesia, o respeito etc.
ressonam a caridade católica e são marca do caráter do cavaleiro cristão. Não
está bem que faltemos a isso, se contamos com boas armaduras e educadas e
sólidas e razoáveis para um Bom Combate. Nunca está demais repetir isto: o
coração e a língua que desejam receber a Sagrada Forma não podem ser os mesmos
a que faltem comedimento, pudor, honradez
Pois que de um Bispo diocesano, mediante
um primeiro e leal diálogo (como gostam hoje desta palavrinha!), não se
convencer em alterar seu decreto proibitivo da recepção sacramental sobre a
língua, os leigos católicos podem
valer-se de meios canônicos regulares :
submetendo os fatos à Congregação
para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, ora sob a Presidência do
Cardeal Dom Antonio Cañizares Llovera (Palazzo delle Congregazioni -Piazza Pio
XII, 10 -00120 -Città del Vaticano -Santa Sede -Fax: 06-6969-3499 -e-mail’s: cultidiv@ccdds.va e vpr-sacramenti@ccdds.va), bem como à
apreciação do Núncio Apostólico no Brasil, Dom Giovanni D’Aniello (Nunciatura
Apostólica – Av. das Nações, Quadra 801 Lt. 01/ CEP 70401-900 -Brasília -DF
-CEP 70359-916 -Fax: (61) 3224 – 9365 e–mail: nunapost@solar.com.br)
4.Permitam-me um pequeno acréscimo
Essa regra proibitiva de que estamos
a tratar, a que veda o recebimento da Santa Hóstia sobre a língua, tem seu
declarado motivo (nota bem : não uso aqui o termo “pretexto”) em que se
proteja a saúde pública ante o risco de contaminação pelo vírus Influenza A
–subtipo H1N1 . É, pois, a defesa do bem da vida humana o que
se põe à raiz expressiva dessa proibição
Assim, para considerarmos alguns
poucos exemplos, a recolha da espórtula durante a Missa não será tão ou até
mais propícia à contaminação viral de que se receia? Aqueles folhetos −que
havemos de ler sempre com olhos cristãmente precavidos−, aqueles folhetos com
textos litúrgicos nem sempre de bons modais, não serão eles veículos também
possivelmente infectantes? Um pouco adiante: se a preocupação central dessa
proibição é com a vida humana, como insistir em que há pecado no
uso de preservativos por infeccionados de Aids ?
5.É muito conhecida −e um tanto
imprudentemente exalçada− uma passagem do poeta sevilhano Antonio Machado que
diz “Por mucho que valga el hombre, nunca tendrá valor más alto que el de
ser hombre”
Ora, esse apotegma é verdadeiro no
plano cosmológico e ontológico, ou seja, quando consideramos o homem no
conjunto das coisas criadas e em seu ser imago Dei
Mas a sentença de Antonio Machado é
perigosamente falsa no domínio moral. Valor mais alto do que ser homem é o de o
homem ser justo, é o de o homem ser santo, de modo que ser justo e santo vale
mais, moralmente, do que ser simplesmente homem, porque ser apenas homem
implica participar da espécie mesma que tem heróis e mártires, mas tem também
ladrões e homicidas e hereges e apóstatas (aqui peço licença para reportar-me a
um imperdível estudo de Leopoldo Eulogio Palacios, El humanismo del
bien congênito)
Aí se põe um aspecto importante de
nosso problema: a vida humana terrena é um bem valiosíssimo, mas é um bem
finito e, como tal, infinitamente menos valioso que o Supremo Nosso Bem. Não se
pode exagerar o valor da vida humana “à custa do respeito que
se deve a Deus” (Palacios)
Como entenderíamos o martírio −e
agora temos bem à nossa vista o do Padre François Murad−, se a vida humana
peregrina fosse um bem superior à santidade?
O grau de respeito com que devemos
aproximar-nos da Sagrada Forma é consequente de um dado resultante da Fé: CREMOS
NA PRESENÇA REAL? - (FRATRES IN UNUM)
É o certo estão recebendo o corpo de CRISTO.
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