“O trabalho é obra de Deus. Deus, ao criar o homem, colocou-o no jardim do Éden para nele trabalhar. O trabalho existe, portanto, antes do pecado. Depois deste, passou a ter a conotação de penitência, pois adquiriu uma nota de dificuldade e o necessário esforço para desempenhá-lo: “Comerás o pão com o suor do teu rosto” (Gn 3,19).”Em nossos dias o conceito de trabalho mistura-se quase que inseparavelmente com o da profissão, a reunião de meios imateriais (idéias, conceitos, doutrinas, princípios, etc.) e materiais (tecnologias diversas) com vistas à solução de problemas específicos. Trabalho, profissão, organização, empresa, em nossa época passaram a ser conceitos e realidades fortemente interligados. A questão da vocação natural, no Brasil dos dias de hoje, mostra toda sua importância à luz das dificuldades que tenho notado na vida de orientandos em prol de quem trabalho. Vale exemplificar com as dificuldades de uma candidata à faculdade de Medicina. Na faculdade de Medicina (o que certamente também vale para outras faculdades), os alunos distribuem-se mais ou menos assim: 10 a 15% é o percentual dos melhores alunos, os “nerds” capazes de aprovação em praticamente qualquer tipo de avaliação técnica de conhecimento; de 70 a 75%, alunos medianos, que não são brilhantes como os nerds nem pouco produtivos quanto os restantes 25 ou 30%. Como é comum em curvas de aproveitamento, o maior número é composto de alunos medianos, entre os quais se enquadra a referida orientanda. Ela é boa aluna por causa de hábitos desenvolvidos desde seu início da vida escolar: seus pais sempre puderam mantê-la em boas escolas, com mensalidade acima do que a média dos assalariados conseguiria pagar. Mas não parece ser o tipo de estudante capaz de ter êxito numa disputa acirradíssima por vagas em faculdade de Medicina. Isto exigiria dela esforço e dedicação que ela não parece disposta a fazer. Na capital onde reside, há cinco boas faculdades públicas de Medicina, neste total incluídas a federal e estaduais. Mas eis o que ocorre: diminuiu o número real de vagas “técnicas”, isto é, as vagas resultantes de pontuação elevada no vestibular. Em contrapartida, foram criadas vagas “políticas”, isto é, as vagas por cotas, que permitem o ingresso de candidatos com baixa pontuação no vestibular. Por exemplo, para ingressar na faculdade por vaga técnica, o candidato tem de conseguir pontuação igual ou superior a 85%; para os cotistas, 60 ou 70% são suficientes. O resultado da divisão das vagas em “técnicas” e “políticas” (denominação que utilizo por minha própria conta e risco) é este: estudante como esta orientanda, no passado, concorria a 70% do total das vagas (porque 30% por cento são algo assim como território e propriedade dos nerds); no presente, concorre por, no máximo, 40 a 50% do número total dessas mesmas vagas. Porque: 30% é dos nerds; 30% dos cotistas; 40% do restante, onde se inclui esta minha orientanda. A solução que pais como o desta orientanda encontraram foi matricular os filhos em faculdades particulares, com altas mensalidades (acima de três mil e quinhentos reais). Com mensalidade tão alta, os professores têm franca liberdade para reprovar os alunos pouco aplicados, diferentemente do que acontece nas instituições cuja mensalidade é de valor “popular”, que dependem de um maior número de alunos para cobrir os custos de funcionamento. De modo que o cenário fica assim: os alunos “de ponta” continuam disputando vagas nas universidades públicas; os medianos, nas faculdades particulares; os cotistas, na públicas, onde o governo (por enquanto) possui maior poder de ingerência direta. Qual o possível impacto que esta realidade – admitindo-se que meu raciocínio esteja certo – poderá ter sobre as gerações futuras? Creio que o rebaixamento da qualidade técnica dos profissionais. Fiquemos apenas com os médicos, para não sobrecarregar o raciocínio de hipóteses abstratas. Os médicos “nerds”, egressos das instituições públicas, continuarão gozando do privilégio de elevada empregabilidade, pois continuarão conseguindo os melhores estágios, nos melhores hospitais. Porque todo governante cuida bem da segurança e conforto de si e de sua família. É de se crer que a maioria de tais médicos recusará exercer práticas não médicas, como o aborto e a eutanásia. O mesmo vale para os egressos das boas faculdades particulares. Como em geral pertencem a famílias de elevado poder aquisitivo, não precisarão, pelo menos na maioria, se submeter aos critérios de estrita observância nos hospitais públicos. Porque estes, assim como os anteriores, por sua boa formação, estarão mais aptos a conseguirem boa remuneração, sem temerem perder o emprego. O grupo dos formandos beneficiados por critério político de vagas, não obstante possuírem diplomas de mesma validade legal, contudo, provavelmente terão problemas maiores quanto à sua empregabilidade. O seu rendimento na graduação (como já se nota nas universidades onde ingressaram) tem sido deficiente. Para os tais, a alternativa de emprego público provavelmente será a melhor opção. Oriundos que são de família de menor poder aquisitivo, dependerão mais do emprego e, portanto, estarão mais sujeito às instáveis contingências criadas pelas decisões políticas dos sucessivos governos pró-aborto, pró-eutanásia, e assim por diante. Por exemplo, logo após a decisão do STF a favor do aborto de crianças anencéfalas, saltou o número de hospitais públicos credenciados a oferecerem tal “serviço”, os quais serão executados por profissionais reféns do emprego. Um médico com baixa perspectiva de empregabilidade por certo se sentirá mais forçado a contrariar a razão formal de sua profissão (cuidar da saúde do paciente) do que aquele outro, que tenha feito melhor estágio, pertença a família de elevado poder aquisitivo, etc.. Um dos recursos capazes de mitigar o alto impacto negativo do contexto que está sendo construído diante dos olhos de todos nós, parece-me ser o incentivo à educação vocacionada. Porque a solução que se adotou nos Estados Unidos para o problema das cotas raciais não são aplicáveis no Brasil. Nos Estados Unidos, as próprias comunidades negras passaram a fazer a triagem dos cotistas negros a entrarem nas faculdades por meio de cotas raciais. Deste modo, os negros universitários representavam aquela parte que, na verdade, conseguiriam disputar vagas com os 70% acima mencionados. Mas nesta solução ficou reconhecida a existência de discriminação racial. No Brasil, esta solução seria rejeitada por ser vista como racial, embora racial mesmo seja o próprio sistema de cotas: a diminuição da exigência de conhecimento para negros e índios é a institucionalizaçõ formal da crença na inferioridade intelectual desses grupos. Não é que resolva a dificuldade apontada para as futuras gerações, mas com certeza a ênfase na educação vocacionada, desde os primeiros anos escolares, ajudará a mitigar os efeitos danosos da imprudência de nossos legisladores. Querendo servir ao povo, impõem leis que o prejudicam. Não é prudente também esquecer que, pela ordem de importância, os desvios vocacionais são piores quando ocorrem entre os sacerdotes, juristas e médicos. As leis recentemente criadas facilitam o desvio vocacional no caso dessas duas últimas categorias mencionadas. Os que puderem devem levar em conta o assunto da vocação no que diga respeito a seus próprios filhos; não devem esperar por alguma ação positiva do poder público nesse sentido. Porque já estamos vendo o que esta instância social tem feito em prol de nossa juventude: atrapalhado! Joel Nunes dos Santos, em 03 de maio de 2012.
domingo, 6 de maio de 2012
Vocação e Trabalho-3
É possível que estejamos vivendo numa época, no Brasil, em que a questão da vocação assume (ou deve assumir) importância fundamental. Isto vale tanto no que se refere à vocação sobrenatural (ou vocação no sentido principal em que a Igreja a toma, quando convida os fiéis a rezarem para que “o dono da messe mande trabalhadores”) quanto à natural (no sentido em que responda à pergunta “qual é a minha vocação e com qual profissão,trabalho ou carreira ela combina”?)
Sobre o que é o trabalho, seu significado para a vida do homem, vale citar as palavras contidas no artigo do Bispo Dom Fernando Arêas Rifan, em seu artigo para o dia 2 de maio de 2012.:
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário